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terça-feira, janeiro 15, 2008


          Rafael Monteiro

     O cantor e autor Caetano Veloso já tinha feito referência, num seu livro de 1997 — "Verdade Tropical" — a uma visita que fizera a Rafael Monteiro, no castelo de Sesimbra, e da impressão que lhe causara esse encontro. O mesmo acontecimento ressurge no seu livro "O Mundo Não é Chato", colectânea de artigos de várias décadas. A referência a Rafael Monteiro está incluída no texto de uma conferência realizada em 1993 no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Caetano Veloso questiona qual o papel que o Brasil poderá ter no mundo, ou seja, para transformar o mundo num lugar melhor, e recorda Fernando Pessoa e Agostinho da Silva, a propósito do papel civilizador que estes pensadores reservavam para a língua portuguesa, para os povos de língua portuguesa. E a referência a Rafael Monteiro surge nesta mesma linha de pensamento.
     Contudo, melhor do que eu poderia alguma vez fazer, o Pedro Martins contextualiza as palavras de Caetano Veloso num texto do blogue Maranos, cuja leitura aconselho.
     Ao contrário do que se poderia pensar, o legado de Rafael Monteiro não se resume à "explicação" que ele fez de Sesimbra, a qual muitos repetem (até porque ninguém foi capaz de propôr outra), sem se aperceberem de que a ele a devem. Rafael Monteiro, tal como muitos dos seus amigos filósofos — Agostinho da Silva, António Telmo, Orlando Vitorino — tiveram a clara percepção do beco-sem-saída para onde nos conduzia a modernidade racionalista. Isso levou-os a travar uma luta desigual contra a tendência dominante da sociedade portuguesa, apostada primeiro em destruir o regime salazarista em troca de um modelo de sociedade colectivista, e depois, mais recentemente, submetendo-o ao programa de modernização tecnológica e produtivista proposto pela Europa tecnocrática, ainda que à custa dos valores fundamentais que nos definem como portugueses — ou seja, ainda que à custa da destruição de Portugal.
     Caetano Veloso, no seu texto, exprime, relativamente ao Brasil, exactamente a mesma questão que Rafael Monteiro se colocava a propósito de Portugal: como pode evitar ser engolido pela civilização tecnológica dominante? O facto de Caetano evocar Rafael a esse propósito, é algo que diz muito acerca do grande valor deste sesimbrense. E é importante. Não por Caetano ser um brasileiro famoso, que esteve de passagem no castelo de Sesimbra, a caminho de Londres, exilado pela ditadura militar brasileira, e ter sido acolhido cordialmente pelo "velho alquimista". Mas porque a pergunta persiste. E a pergunta é para nós.

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