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Castelo de Sesimbra em ruínas, antes da recuperação de 1936/1941 (*).
Na passada sexta-feira, 22 de Junho, o arqueólogo Luís Ferreira fez uma excelente palestra, incluída no ciclo das Conversas na Capela do Espírito Santo dos Mareantes. A qualidade da comunicação deve-se sem dúvida ao facto de a mesma se apoiar na investigação académica desenvolvida pelo arqueólogo, "Da Pedra ao Acorde", mas também ao trabalho efectivo realizado na Câmara Municipal de Sesimbra. Mesmo para aqueles que acompanham mais atentamente a vida cultural de Sesimbra, a conferência esteve recheada de novidades, tais como as recentes descobertas relativas à Sesimbra medieval, as quais permitem estabelecer uma cronologia para a sua evolução (ao invés do que muitos pensam, o castelo não foi logo de origem construído com o aspecto que tem hoje) bem como delinear já com alguma precisão a organização da vila no interior da cerca medieval.
Foi interessante saber que Sesimbra é o único castelo medieval português junto à costa marítima, já que os outros foram transformados em fortalezas por imposição das novas tecnologias militares. Também interessante é o enredo (ainda por esclarecer) da construção da torre sul, que pode ter sido justificada pela necessidade de comunicação visual com o Forte de S. Teodósio. Outra hipótese interessante adiantada por Luís Ferreira é a de ter havido uma divisão territorial, no concelho de Sesimbra, entre as comunidades árabes e as cristãs, tendo o castelo como referência. Esta hipótese apoia-se no facto muitos topónimos a poente do concelho terem origem árabe, ao contrário do que acontece a nascente, e também em aspectos construtivos das muralhas da cerca sesimbrense.
Parte da comunicação, igualmente de muito interesse, foi dedicada a expor um modelo de gestão para o património cultural, exemplificada com o apoio de dados estatísticos relativos aos investimentos e ao uso do referido monumento.
Luís Ferreira ainda falou de algumas novidades arqueológicas relativas à vila ribeirinha e detalhou a recente notícia da descoberta de "cetárias" do período romano junto à fortaleza de Santiago, que passam a constituir o documento mais antigo da ocupação da actual vila no período histórico. Estas cetárias, que se encontram em grande quantidade em Setúbal e Tróia, destinavam-se ao fabrico de compostos alimentares a partir de peixe, nomeadamente o garum, iguaria muito apreciada em Roma.
A qualidade desta reflexão ajuda certamente a compreender a valia dos investimentos e das actividades desenvolvidas no castelo ao longo dos últimos anos, mas mostra igualmente que há ainda imenso a fazer para que os sesimbrenses (de todo o concelho) conheçam melhor a História da sua terra, da qual justamente se podem orgulhar.
Espera-se, entretanto, que seja resolvido o paradoxo criado ao Centro de Documentação Rafael Monteiro, hoje mais usado como posto de informação turística. Rafael Monteiro, o último residente no castelo de Sesimbra, foi pioneiro na recuperação da memória histórica para a afirmação da identidade Sesimbrense, actividade que desenvolveu com grande amor, embora também com grandes dificuldades. Certamente que os sesimbrenses saberão continuar a homenagear a sua memória.
(*) «A carripana vai descendo para Sesimbra pela estrada em torcicolos, entre dois montes que se abrem, um com moinhos velhos afadigados lá no alto, outro com o castelo em ruínas como um queixal cariado.» - Raul Brandão, "Os Pescadores" (1923)
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