Ritual injusto
Hoje é dia de "matar o Judas": uma tradição muito arreigada em Sesimbra, e que parece radicar na ideia de castigar o apóstolo que traíu Jesus e o denunciou aos Romanos.
No entanto, uma sombra paira sobre este ritual. A recente divulgação do denominado Evangelho segundo Judas, levanta a dúvida sobre se são justificadas as suspeitas ou se, pelo contrário, Judas Iscariotes terá sido, até ao fim, o mais fiel discípulo de Jesus.
Alguns explicam que quem quer que seja que tenha escrito este Evangelho, contou a história "à sua maneira", de modo a favorecer a corrente cristã conhecida como "Gnósticos". Mas, nesse caso, teremos igualmente de aceitar que os Evangelhos canónicos, aqueles que fazem parte da Bíblia, também foram "escritos à maneira" de alguém, e que a demonização de Judas teria tido como objectivo mostrar que os cristãos nada tinham a ver com os Judeus, que nessa altura não eram nada populares no Império Romano (tinham levado a cabo uma revolta contra Roma).
Como se sabe, Jesus e todos os seus discípulos eram judeus, e a mensagem religiosa de Jesus começou por ser uma variante do Judaismo - embora contivesse em si uma base filosófoca muito diferente daquela religião. O Cristianismo de hoje - nas suas várias correntes - é muito diferente dos Judaismo, mas essa diferença foi-se construindo ao longo dos séculos, nomeadamente com a escolha, de entre as várias dezenas de Evangelhos que existiram, dos quatro que passaram a integrar a Bíblia.
O Evangelho Segundo Judas, apesar de apresentar uma versão diferente da vida de Jesus, não vai modificar o Cristianismo. Mas deve-nos fazer meditar sobre se é justificado este ritual macabro de queimar um boneco representando uma pessoa, fazendo ecoar séculos de intolerância e violência das comunidades cristãs contra os Judeus.
Eu, este ano, não vou "queimar o Judas".
6 Comentários:
Estranho de um momento para o outro questionar-se o papel de Judas. E o Vaticano? Qual a sua opinião? Ou é favorável este novo evangelho ás pretensões deste novo Papa? E os evangelhos de Jesus Cristo e de Maria Madalena
? Esses é que não convêm mesmo aparecer... Seriam demasiado chocantes e...romanticos? Não é o amor a interminável busca feita pelo, seja qual for a sua religião? Não é a busca do amor que está na base de todos os evangelhos que compôem a Biblia? Porque não Jesus Cristo amar ... a uma esposa... a uma filha... aos homens e a seu Pai? Por mim e por muita gente, seria perfeitamente normal. O celibato não o faria mais inatingível,bem pelo contrário. É a sua semelhança com o mais vulgar dos Homens, que ama e sofre por amor, seja esse amor maternal, paternal, fraternal, marital, etc, que torna Jesus próximo dos homens e um exemplo a seguir. Acreditem na Ressurreição de Jesus, mas como Homem/Homem. Como homem com características terrenas... aproximem-no de Vós.
Não é nada estranho: coincide com a divulgação do Evangelho segundo Judas, a partir de uma versão copta. Se fossem conhecidos os originais das dezenas de Evangelhos que existiram, certamente que se ficaria a conhecer melhor a história da época em que Jesus Cristo viveu. Mas isso em nada alteraria as religiões cristãs.
Acha mesmo que não? Pense lá bem!
Estou convencido que não. Jesus Cristo lançou um conjunto de ideias simples e poderosas que, ao longo dos séculos, nos foram ajudando a conduzir a nossa vida pessoal e colectiva. A base disso são as ideias divulgadas por Jesus, e não os episódios históricos da sua vida pessoal.
Até mesmo nos Evangelhos canónicos se encontram contradições. Mas isso é importante? Claro que não.
Por exemplo: dizem alguns que talvez Jesus considerasse Judas como o apóstolo mais inteligente, que melhor percebia a sua mensagem, enquanto os outros se situavam muito longe desta compreensão. Também dizem que Jesus tinha uma especial preferência por conviver com mulheres, nomeadamente Maria Madalena. Caso isto se viesse a provar como verdade histórica, alteraria alguma coisa dos seus ensinamentos? Certamente que não.
Uma das coisas mais inteligentes que a Igreja Católica fez foi centrar-se na mensagem de Jesus e simplificar os detalhes de vida de Jesus, que tinham que ver com os usos e costumes daquele tempo.
Por exemplo: o Corão, que tem muitas semelhanças com a Bíblia, também está repleto de factos contingenciais, coisas típicas da época do profeta Maomé. Ora, em muitos circulos maometanos, continua-se a defender a manutenção de usos e costumes arcaicos tal como aparecem descritos no Livro, dificultando o funcionamento da própria sociedade.
Em suma: a mensagem de Cristo encontra-se extraordinariamente veiculada através de metáforas: uma forma poderosa de transmissão de ideias, apropriada a uma época onde dominava a oralidade, mas que ainda hoje mantem a sua força comunicativa. Essa mensagem foi sendo interpretada e aplicada ao longo dos séculos, a modos de vida que foram evoluindo. Nada disso poderia ser alterado ou abalado por pormenores históricos que contradigam aspectos secundários dos Evangelhos.
Concordo, plenamente. Bem visto, como sempre!
A foto da queima do judas no átrio da igrja com toda aquela gente á volta é, nos dias de hoje inacreditável. Até parece que estamos na palestina ou no iraque.
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